Para entender o nosso problema, precisamos primeiro entender o que é concentração e alguns atributos que a acompanham.
Antes de mais nada…
Você sabe a diferença entre foco e concentração?
Foco é a atenção seletiva, quando nos voltamos para determinado alvo, direcionando os processos cognitivos a ele.
Já a concentração é a capacidade de manter-se atento por um período constante de tempo. Basicamente é manter o foco contínuo na atividade que estamos fazendo. É conseguir omitir ou ignorar outros estímulos para centrar-se nos estímulos pertinentes a determinada atividade.
Por exemplo: quando andamos numa avenida movimentada, estamos em um estado de concentração, para que não sejamos atropelados ao atravessar a rua ou para não esbarrar em alguém enquanto andamos na calçada.
Ou seja, a capacidade de voluntariamente centrar-se em um objeto, objetivo ou atividade.
Fica claro então que o processo de concentração é indispensável no nosso dia a dia e sem esta habilidade, ideias, pensamentos ou memórias poderiam, simplesmente, se perder.
Mas fique atento! Temos outro fator importante: a memória.
Concentração e memória andam lado a lado, mas não são a mesma coisa.
O que acontece é que quando nos concentramos, direcionamos nosso “poder mental” ou esforços em determinado assunto. Já a memória é como o cérebro armazena informações, sendo responsável por nos lembrar de fatos, experiências e pessoas.
A concentração contribui para que a informação seja armazenada no nosso cérebro, a partir daí ela nunca se perde, mas às vezes temos dificuldade em recuperá-la.
Aí que está o grande segredo. A concentração aumenta nossa capacidade de retenção de memória. Não adianta se aprofundar em técnicas que melhorem a memória se também não nos focarmos em técnicas que atuem na concentração. Caso contrário, o nosso resultado será parcial.
Entendendo o problema: tecnologia x concentração.
Muito se diz que a tecnologia é uma grande vilã quando falamos de concentração, será isso mesmo? O primeiro passo para nos aprofundarmos na análise é entender a definição da palavra tecnologia.
“Tecnologia é um produto da ciência e da engenharia que envolve um conjunto de instrumentos, métodos e técnicas que visam a resolução de problemas.”
Isso significa que tudo o que foi criado, desde do fogo e a roda, maquinários antigos, aparelhos móveis, nanotecnologia e outros, está dentro do significado da palavra.
Logo, é bom definir o escopo do nosso problema. A tecnologia que estamos abordando e tratando neste artigo é a “tecnologia digital”, composta por nossos computadores, dispositivos móveis, tablets, televisores smart, entre outros.
Te convido a fazer um brainstorming para analisarmos como a tecnologia pode nos afetar negativamente, quando relacionada com a concentração.
Antes de procurarmos a causa raiz do nosso problema, é preciso ter uma visão mais abrangente dele. Vamos investigar todas as causas potenciais ou reais que causam a falta de concentração devido a tecnologia.
Ambiente
A tecnologia está presente em tudo. Nossas casas são inteligentes, nossos relógios também, os aparelhos móveis são multifuncionais e todos os confortos da vida moderna são repletos de aparatos tecnológicos. Por isso, vivemos com um excesso de informações nos bombardeando o tempo todo, seja nas redes sociais, sites ou canais de notícias.
Além disso, nosso entretenimento é muito dependente da internet, por exemplo, os sites de streamings, sites de vídeos e plataformas de games. A nossa geração está de fato acostumada com uma rotina multitarefas e sempre estamos fazendo várias coisas ao mesmo tempo.
Método
Quando precisamos produzir ou aprender algo, diversas vezes utilizamos o meio digital como ferramenta para alcançar este objetivo. Quando não dependemos diretamente do meio digital, quase sempre algum aparato tecnológico que possa causar distração está em nossa posse.
Não definimos metodologias eficientes para focar no que é importante e somos ineficientes na gestão de tempo. A falta de priorização impede que o foco seja contínuo e que criemos memórias duradouras sobre o objetivo traçado.
Aspecto Social
Nos manter atualizados parece (ou é) crucial hoje. Quando nos afastamos durante um dia das informações, parece que perdemos fatos indispensáveis para o convívio profissional ou social.
Sejam decisões políticas, tragédias, acontecimentos importantes de pessoas ilustres, repercussões internacionais ou até mudanças no clima.
É o famoso: “você viu o que aconteceu hoje?”
É certo que esse acesso a notícias não é novo, vem de antes dos adventos digitais. Antigamente o “tempo de espera” entre uma notícia e outra era maior. Quando por exemplo os aparelhos celulares inteligentes não existiam, tínhamos que estar próximos a um televisor ou esperar o jornal da noite para receber notícias pertinentes do dia. Ou antes disso, quando existiam somente jornais impressos, as notícias só chegavam no outro dia de manhã. Seguindo essa lógica, é melhor nem imaginar quando as coisas eram em tempos mais remotos.
E vale lembrar que o mesmo acontecia para comunicação entre pessoas. Antes não conseguíamos nos comunicar por mídias (fotos e vídeos). Caminhando mais para o passado só tínhamos acesso ao telefone fixo. E antes disso, cartas, telegramas e ferramentas muito mais rudimentares.
Encontrando a causa raiz
Conseguimos um norte! O próximo passo é investigar a raiz do problema
Vamos nos perguntar cinco vezes o porquê da tecnologia ser tão mencionada e chegaremos às nossas conclusões sobre a causa raiz. Posteriormente, analisaremos o problema com mais atenção.
1) Por que a tecnologia atrapalha a nossa concentração?
Porque ela nos distrai, diluindo o nosso foco em diversas atividades.
2) Por que a tecnologia nos distrai?
Porque a informação e entretenimento se tornaram muito mais fáceis e acessíveis, e nos fornecem atualizações instantâneas o tempo todo, sobre uma variedade de assuntos e pessoas.
3) Por que estas atualizações são tão constantes?
Porque existe uma necessidade do público que a recebe em consumi-la.
4) Por que há esta necessidade?
Porque hoje nossas bases sociais são fortemente moldadas em relação a estes insumos.
5) Por que precisamos tanto destes insumos?
Porque esses insumos e a facilidade que eles promovem causam uma certa dependência.
Para termos certeza de que as nossas perguntas foram bem selecionadas, vamos fazer a contraprova, que nada mais é do que fazer o caminho inverso, da última resposta até a primeira.
“Devido a dependência, precisamos frequentemente das facilidades que a tecnologia nos traz, pois temos a necessidade de nos manter atualizados diante da constância que as informações são renovadas, portanto, somos frequentemente distraídos por ela, causando assim a falta de concentração.”
Certo. Segundo a minha avaliação pessoal, eu entenderia que a causa do problema é a dependência que temos em relação a tudo que a tecnologia digital nos promove. Ou melhor, não tudo. O termo tecnologia digital ainda é muito amplo.
Vamos limitar a nossa pesquisa.
Acho que quando falamos em concentração, o nosso alvo pode ser centrado nas mídias sociais e na internet como um todo, concordam?
E é isso!
Mas será que isso é tudo? Não seria o problema da falta de concentração algo mais complexo?
Vamos a fundo!
O que a ciência diz sobre isso?
Como eu disse, esse problema não parece tão simples. Existem diversos fatores externos que contribuem para a falta de concentração de um indivíduo. Se negligenciarmos este tipo de análise haverá momentos em que a causa será somente uma casualidade.
Como assim?
Imagine que você está analisando uma pessoa em específico. Seria muito precipitado concluir que a falta de concentração dela está ligada somente às redes sociais e internet, ou até mesmo dizer que esses são os principais fatores.
O fato é que: de maneira geral, a tecnologia tem uma influência negativa nas pessoas quando falamos a respeito de concentração. Mesmo que este conjunto de técnicas possibilite o contrário (quando a tecnologia é utilizada a favor da concentração) o que predomina é o seu papel de antagonista.
O que não enxergamos de primeira é que podem existir causas ocultas que geram a falta de concentração.
Se não houver um cuidado ao realizar a análise, em determinados momentos, chegaremos à conclusão errada sobre a falta de concentração de um determinado indivíduo.
Sendo mais claro… em determinados indivíduos a causa da falta de concentração será somente devido a sua dependência da tecnologia, sendo esta dependência de fato uma necessidade de uso abusivo, em outros somente uma comodidade/prioridade; e em alguns casos problemas cognitivos, neurológicos, entre outros.
Encontrar todas as causas de um problema tão subjetivo é impossível ou quase, vamos então nos focar na identificação das principais causas ocultas. Para isso devemos entender quais outros fatores estão ligados à falta de concentração de uma pessoa.
Temos duas perguntas que devem ser respondidas:
Porque existem momentos em que estamos mais concentrados do que outros?
Porque em determinadas atividades conseguimos nos concentrar mais facilmente e em outras não?
Foi dito que o amontoado de informações que recebemos interfere na concentração. Vamos entender agora como o cérebro funciona diante disso. Explicaremos como é o funcionamento do nosso sistema nervoso ao receber múltiplos estímulos.
Na visão, por exemplo, quando focamos em um determinado objeto, neurônios no córtex visual que estão em resposta a este objeto entram em sincronia e suprimem aqueles que respondem a objetos irrelevantes. É quase como se esta sincronia aumentasse, fazendo com que estes neurônios se destaquem em relação aos outros.
Esta sincronia está relacionada com a frequência das ondas cerebrais. E a frequência por sua vez está relacionada com o nosso estado de foco/concentração ou distração.
Estudos mostraram que a frequência alfa em um campo entre 8 e 10 Hz está associada com baixa concentração, enquanto sincronia em frequência gama, entre 30 e 150 Hz está associada com atenção e foco.
Então quando um estímulo é propositalmente ignorado a força alfa é aumentada, em contrapartida, um estímulo em foco têm um aumento da força gama.
Uma situação curiosa! Imagine que durante suas transições de pensamentos, você está concentrado estudando mas começa a pensar no seu cafezinho, que não está no centro do seu campo de visão no momento. O seu foco mental então começa a mudar para o café. Há uma grande chance de você direcionar o seu olhar sorrateiramente para a xícara de café!
Antes, pensava-se que estes olhares rápidos eram aleatórios, mas hoje compreende-se que isto está ligado à concentração. Então quando falamos de atenção espacial, o olhar tem um papel muito importante.
Sabe-se também que o cérebro possui uma região, o “blue spot” em português algo como ponto azul/região azul, que é um pequeno aglomerado de células, localizado na sua base, que exerce função importante na concentração.
Essa é a principal fonte de noradrenalina, que ajuda no controle da nossa atenção/foco.
Apesar do “blue spot” possuir apenas cerca de 15 mm, ele está conectado à maior parte do nosso cérebro por uma extensa rede de fibras nervosas.
Esta área regula a comunicação neural e contribui para o controle do stress, memória e atenção.
Cientistas comprovaram que a presença ou adição de noradrenalina em neurônios que estão em repouso afeta o ritmo ou sincronia deles, gerando influência nas oscilações alfa. Com isso há um aumento no fator de concentração.
Certo, mas o que isso significa?
Você consegue perceber como o funcionamento do cérebro é essencial na nossa concentração? Apesar deste trecho não explicitar a causa biológica exata para a falta de concentração, conseguimos perceber uma série de mecanismos que atuam em conjunto para aumentar o nosso foco em determinada atividade.
Se você se debruçar em pesquisas e buscar alguns dos motivos do TDAH (Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade), encontrará estudos que mostram que ele ocorre quando há um diminuição de atividade na parte frontal do cérebro, causada pela falta de neurotransmissores como a noradrenalina ou a dopamina.
E aí percebemos que a depender do caso analisado o indivíduo já é propenso a se distrair, mesmo sem acesso à tecnologia.
O importante nessa análise é entender que nem sempre a tecnologia será a causa mais profunda. Ela nunca deixará de ser uma vilã ou antagonista se utilizada de maneira imprudente, mas se soubermos usufruir dos seus benefícios sabiamente, ela será uma aliada para a nossa concentração.
Então antes de encontrar culpados, nunca generalize um problema. Analise!
A partir daí encontre soluções.
E qual a nossa solução?
Quando estiver em um processo de aprendizado, ou de produção, que exige bastante da sua concentração:
Encontre um ambiente propício, com uma quantidade menor de distrações que possam desviar o seu foco. Se estiver utilizando o navegador, feche as guias desnecessárias. Se estiver estudando, coloque o seu celular no silencioso. Procure um lugar com menos estímulos.
Crie ou utilize uma metodologia. Não lute contra o cansaço. Utilize seu tempo de maneira inteligente. Não é eficiente forçar a concentração. Coloque intervalos de tempo que façam sentido para você e procure ferramentas que ajudem a estruturar as suas ideias.
Se cobre menos. Você não precisa estar em contato o tempo todo com o seu ciclo de amigos. Eles podem esperar. Não há a necessidade de estar lendo sempre o último Twitter, de 5 em 5 segundos. Reserve um tempo para você. É importante exercitar o seu foco, mente, memória e concentração.
Se você nunca consegue se concentrar, procure entender o que está acontecendo.
Não hesite em procurar um profissional qualificado.